quinta-feira, 20 de setembro de 2018

Marina Abramović

Marina Abramović
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Artista
Marina Abramović é uma artista performática que iniciou sua carreira no início dos anos 70 e manteve-se em atividade desde então. Considera-se a “avó da arte da performance". Seu trabalho explora as relações entre o artista e a plateia, os limites do corpo e as possibilidades da mente. Wikipédia
Nascimento: 30 de novembro de 1946 (idade 71 anos), Belgrado, Sérvia
Nacionalidade: Sérvio
Cônjuge: Paolo Canevari (de 2005 a 2009), Neša Paripović (de 1971 a 1976)

quarta-feira, 19 de setembro de 2018


Mário de Sá-Carneiro

Portugal
19 Mai 1890 // 26 Abr 1916
Poeta/Contista/Ficcionista

 

Alcool

Guilhotinas, pelouros e castelos
Resvalam longamente em procissão;
Volteiam-me crepúsculos amarelos,
Mordidos, doentios de roxidão.

Batem asas d'auréola aos meus ouvidos,
Grifam-me sons de côr e de perfumes,
Ferem-me os olhos turbilhões de gumes,
Desce-me a alma, sangram-me os sentidos.

Respiro-me no ar que ao longe vem,
Da luz que me ilumina participo;
Quero reunir-me, e todo me dissipo -
Luto, estrebucho... Em vão! Silvo pra além...

Corro em volta de mim sem me encontrar...
Tudo oscila e se abate como espuma...
Um disco de ouro surge a voltear...
Fecho os meus olhos com pavor da bruma...

Que droga foi a que me inoculei?
Ópio d'inferno em vez de paraíso?...
Que sortilégio a mim próprio lancei?
Como é que em dor genial eu me eterizo?

Nem ópio nem morfina. O que me ardeu,
Foi alcool mais raro e penetrante:
É só de mim que eu ando delirante -
Manhã tão forte que me anoiteceu.

Mário de Sá-Carneiro, in 'Dispersão'

domingo, 9 de setembro de 2018

História breve da poesia--DYLAN THOMAS

Dylan Thomas – poemas

Revista Prosa Verso e Arte

Dylan Thomas - poemas
Dylan Marlais Thomas nasceu em Swansea, no País de Gales, a 27 de outubro de 1914. Considerado um dos maiores poetas do século XX em língua inglesa, juntamente com W. Carlos Williams, Wallace Stevens, T.S. Eliot e W.B. Yeats. Dylan Thomas teve uma vida muito curta, devido a exagerada boemia que o levou ao fim de seus dias aos 39 anos, mas, ainda teve tempo de nos deixar um legado poético que o tornou um dos maiores influenciadores de toda uma geração de escritores. Leia mais sobre: AQUI!
“Estamos nus? Temos os nossos ossos e os nossos órgãos, a nossa pele e a nossa carne. Há uma fita de sangue a prender o teu cabelo. Não tenhas medo. Tens um tecido de veias à volta das coxas. O mundo passou numa carga sobre eles, o vento caiu em nada, soprando os frutos da batalha sob a lua. Peter ouviu as canções dos pássaros, mas não eram como as que ouvira aos pássaros, no parapeito do quarto, lançar das gargantas. Os pássaros estavam cegos.”
– Dylan Thomas, em “Uma visão do mar e outros contos”. [tradução de Nuno Vidal]. 2ª ed., Lisboa: Vega Editora, p. 58.

EM TRADUÇÃO DE AUGUSTO DE CAMPOS
A força que do pavio verde inflama a flor
A força que do pavio verde inflama a flor
Inflama a minha idade verde; que rói as raízes das árvores
É a que me destrói.
E mudo eu sou pra dizer à rosa curva
Que à minha juventude encurva a mesma febre de inverno.
A força que através das rochas move a água
Move o meu sangue rubro; que seca os rios vociferantes
Torna em cera os meus rios.
E mudo eu sou para gritar às minhas veias
Que é a mesma boca a sorver a fonte da montanha.
A mão que faz girar a água no charco
Acorda a areia movediça; que amarra o sopro do vento,
Me arma a vela e a mortalha.
E mudo eu sou pra dizer ao enforcado
Que a minha argila e a do carrasco são a mesma argila.
O tempo com seus lábios suga as minhas fontes;
O amor goteja e coalha mas o sangue caído
Calmará suas chagas.
E mudo eu sou pra dizer ao vento como o tempo
Pulsou um céu em torno das estrelas.
E mudo eu sou pra dizer ao tumulo da amante
Que, curvo, em meus lençóis, se arrasta o mesmo verme.
1933
.
The force that through the green fuse drives the flower
The force that through the green fuse drives the flower
Drives my green age; that blasts the roots of trees
Is my destroyer.
And I am dumb to tell the crooked rose
My youth is bent by the same wintry fever.
The force that drives the water through the rocks
Drives my red blood; that dries the mouthing streams
Turns mine to wax.
And I am dumb to mouth unto my veins
How at the mountain spring the same mouth sucks.
The hand that whirls the water in the pool
Stirs the quicksand; that ropes the blowing wind
Hauls my shroud sail.
And I am dumb to tell the hanging man
How of my clay is made the hangman’s lime.
The lips of time leech to the fountain head;
Love drips and gathers, but the fallen blood
Shall calm her sores.
And I am dumb to tell a weather’s wind
How time has ticked a heaven round the stars.
And I am dumb to tell the lover’s tomb
How at my sheet goes the same crooked worm.
1933
– Dylan Thomas, em “Poesia da recusa”. [organização e tradução Augusto de Campos]. Coleção signos 42. São Paulo: Editora Perspectiva, 2006.
§
A mão que assina o ato assassina a cidade
A mão que assina o ato assassina a cidade.
Cinco dedos reais taxam o ar – é a lei.
Cevam o morticínio e ceifam um país;
Os cinco reis que dão cabo de um rei.
A mão que manda mana de um ombro em declínio,
Cãibras deduram nós nos dedos que a cal cala.
Penas de ganso firmam o assassínio
Que pôs fim a uma fala.
A mão que assina o pacto traz a peste,
Praga e devastação, o gafanhoto e a fome;
Grande é a mão que pesa sobre o homem
Ao rabisco de um nome.
Os cinco reis contam os mortos mas não curam
A crosta da ferida e o rosto já sem cor.
A mão rege a clemência como a outra os céus.
Mãos não têm lágrimas a expor.
1933
.
The hand that signed the paper felled a city
The hand that signed the paper felled a city;
Five sovereign fingers taxed the breath,
Doubled the globe of dead and halved a country;
These five kings did a king to death.
The mighty hand leads to a sloping shoulder,
The finger joints are cramped with chalk;
A goose’s quill has put an end to murder
That put an end to talk.
The hand that signed the treaty bred a fever,
And famine grew, and locusts came;
Great is the hand the holds dominion over
Man by a scribbled name.
The five kings count the dead but do not soften
The crusted wound nor pat the brow;
A hand rules pity as a hand rules heaven;
Hands have no tears to flow.
1933
– Dylan Thomas, em “Poesia da recusa”. [organização e tradução Augusto de Campos]. Coleção signos 42. São Paulo: Editora Perspectiva, 2006.
§
E a morte não terá domínio
E a morte não terá domínio.
Nus, os mortos hão de ser um.
Com o homem ao léu e a lua em declínio.
Quando os ossos são só ossos que se vão,
Estrelas nos cotovelos e nos pés;
Mesmo se loucos, hão de ser sãos,
Do fundo do mar ressuscitarão
Amantes podem ir, o amor não.
E a morte não terá domínio.
E a morte não terá domínio.
Sob os turvos torvelinhos do mar
Os que jazem já não morrerão ao vento,
Torcendo-se nos ganchos, nervos a desfiar,
Presos a uma roda, não se quebrarão,
A fé em suas mãos dobrará de alento,
E os males do unicórnio perderão o fascínio,
Esquartejados não se racharão.
E a morte não terá domínio.
E a morte não terá domínio.
Os gritos das gaivotas não mais se ouvirão
Nem as ondas altas quebrarão nas praias.
Onde uma flor brotou não poderá outra flor
Levantar a cabeça às lufadas da chuva;
Embora sejam loucas e mortas como pregos,
Testas tenazes martelarão entre margaridas:
Irromperão ao sol até que o sol se rompa,
E a morte não terá domínio.
1933
.
And death shall have no dominion
And death shall have no dominion.
Dead man naked they shall be one
With the man in the wind and the west moon;
When their bones are picked clean and the clean bones gone,
They shall have stars at elbow and foot;
Though they go mad they shall be sane,
Though they sink through the sea they shall rise again;
Though lovers be lost love shall not;
And death shall have no dominion.
And death shall have no dominion.
Under the windings of the sea
They lying long shall not die windily;
Twisting on racks when sinews give way,
Strapped to a wheel, yet they shall not break;
Faith in their hands shall snap in two,
And the unicorn evils run them through;
Split all ends up they shan’t crack;
And death shall have no dominion.
And death shall have no dominion.
No more may gulls cry at their ears
Or waves break loud on the seashores;
Where blew a flower may a flower no more
Lift its head to the blows of the rain;
Though they be mad and dead as nails,
Heads of the characters hammer through daisies;
Break in the sun till the sun breaks down,
And death shall have no dominion.
1933
– Dylan Thomas, em “Poesia da recusa”. [organização e tradução Augusto de Campos]. Coleção signos 42. São Paulo: Editora Perspectiva, 2006.
§
Recusa a prantear a morte, pelo fogo, de uma menina em Londres
Jamais até que ao homem humilhado
Com ave e fera e flor
A escuridão que os fez
Diga pelo silêncio o fim do último lume
E a hora do torpor
Venha em tropel do mar e se consome
Ainda que eu deva reviver a circular
Sião da perolágrima
E o grão trigal da sinagoga
Hei de salmear a sombra de um só som
Das sementes de sal
No último vale em vestes de lamúria
À majestade e às chamas da criança.
Não me verão matar
O que há de humano na verdade rude
Nem violar a via-crucis da lembrança
Com mais alguma
Elegia à inocência e à juventude.
Com o primeiro morto jaz, filha de Londres,
Vestida amigos, grãos além-agora,
Nas veias turvas de sua mãe se encontra,
No mais secreto da água que não chora
Do Tâmisa que trota.
Depois da primeira morte, não há outra.
1945
.
A refusal to mourn the death, by fire, of a child in London
Never until the mankind making
Bird beast and flower
Fathering and all humbling darkness
Tells with silence the last light breaking
And the still hour
Is come of the sea tumbling in harness
And I must enter again the round
Zion of the water bead
And the synagogue of the ear of corn
Shall I let pray the shadow of a sound
Or sow my salt seed
In the least valley of sackcloth to mourn
The majesty and burning of the child’s death.
I shall not murder
The mankind of her going with a grave truth
Nor blaspheme down the stations of the breath
With any further
Elegy of innocence and youth.
Deep with the first dead lies London’s daughter,
Robed in the long friends,
The grains beyond age, the dark veins of her mother,
Secret by the unmourning water
Of the riding Thames.
After the first death, there is no other.
1945
– Dylan Thomas, em “Poesia da recusa”. [organização e tradução Augusto de Campos]. Coleção signos 42. São Paulo: Editora Perspectiva, 2006.
§
Neste meu ofício ou arte.
Neste meu ofício ou arte
Soturna e exercida à noite
Quando só a lua ulula
E os amantes se deitaram
Com suas dores em seus braços,
Eu trabalho à luz que canta
Não por glória ou pão, a pompa
Ou o comércio de encantos
Sobre os palcos de marfim
Mas pelo mero salário
Do seu coração mais raro.
Não para o orgulhoso à parte
Da lua ululante escrevo
Nestas páginas de espuma
Nem aos mortos como torres
Com seus rouxinóis e salmos
Mas para os amantes, braços
Cingindo as dores do tempo,
Que não pagam, louvam, nem
Sabem do meu ofício ou arte.
1945
.
In my craft or sullen art.
In my craft or sullen art
Exercised in the still night
When only the moon rages
And the lovers lie abed
With all their griefs in their arms,
I labour by singing light
Not for ambition or bread
Or the strut and trade of charms
On the ivory stages
But for the common wages
Of their most secret heart.
Not for the proud man apart
From the raging moon I write
On these spindrift pages
Nor for the towering dead
With their nightingales and psalms
But for the lovers, their arms
Round the griefs of the ages,
Who pay no praise or wages
Nor heed my craft or art.
1945
– Dylan Thomas, em “Poesia da recusa”. [organização e tradução Augusto de Campos]. Coleção signos 42. São Paulo: Editora Perspectiva, 2006.
§
Não vás tão docilmente
Não vás tão docilmente nessa noite linda;
Que a velhice arda e brade ao término do dia;
Clama, clama contra o apagar da luz que finda.
Embora o sábio entenda que a treva é bem-vinda
Quando a palavra já perdeu toda a magia,
Não vai tão docilmente nessa noite linda.
O justo, à última onda, ao entrever, ainda,
Seus débeis dons dançando ao verde da baía,
Clama, clama contra o apagar da luz que finda.
O louco que, a sorrir, sofreia o sol e brinda,
Sem saber que o feriu com a sua ousadia,
Não vai tão docilmente nessa noite linda.
O grave, quase cego, ao vislumbrar o fim da
Aurora astral que o seu olhar incendiaria,
Clama, clama contra o apagar da luz que finda.
Assim, meu pai, do alto que nos deslinda
Me abençoa ou maldiz. Rogo-te todavia:
Não vás tão docilmente nessa noite linda.
Clama, clama contra o apagar da luz que finda.
1945
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