segunda-feira, 16 de dezembro de 2019

sábado, 14 de dezembro de 2019

sábado, 23 de novembro de 2019

o sítio dos desenhos: José Mário Branco (1942-2019)

o sítio dos desenhos: José Mário Branco (1942-2019): . Não embarco na ideia do fim da História.  Nos anos 80 e 90, o pós-modernismo foi a versão cultural do neoliberalismo. Nós aprendemos...

sábado, 19 de outubro de 2019


in jornal Expresso, com a devida vénia


Entrevista
Woody Allen
“O extremismo político nunca fez nada de bom pela raça humana”


<span class="creditofoto">foto Jennifer S. Altman/Contour/Getty Images</span>
foto Jennifer S. Altman/Contour/Getty Images
Aos 83 anos, Woody Allen traz uma nova comédia romântica. “Um Dia de Chuva em Nova Iorque” nada tem de autobiográfico e contudo revela muito dos sonhos e das frustrações de um cineasta que continua a sentir-se “ansioso e vulnerável”. Estreia-se na quinta-feira
POR Francisco ferreira Em PARIS
Comédia de Woody, mesmo romântica, tem sempre travo agridoce e aí está “Um Dia de Chuva em Nova Iorque” a comprová-lo. Nas pouco mais de 24 horas que dura a aventura, um jovem casal de namorados universitários decide passar um fim de semana agradável na cidade que nunca dorme — só que o piso está ‘molhado’ e cada um deles escorrega à sua maneira. Ela chama-se Ashleigh, encontra a oportunidade de entrevistar um realizador de carisma e depois deixa-se deslumbrar pelo mundo de aparências do cinema. Ele, Gatsby de seu nome, evita encontrar os pais mas o acaso força-o a apresentar-se numa luxuosa reunião de família em que ele vai simular ser quem não é. Tal como o casal de “O Sheik Branco”, obra de estreia de Fellini (do qual “Um Dia de Chuva...” é, talvez, um longínquo remake...), Ashleigh e Gatsby enfrentam, cada um à sua maneira, uma falsa relação com a realidade. Timothée Chalamet e Elle Fanning, dois ótimos atores em ascensão, entram pela primeira vez no universo do cineasta americano e também por lá andam Jude Law, Selena Gomez, Liev Schreiber, Rebecca Hall e Diego Luna. Conversámos com Woody Allen no final de agosto numa suíte do Bristol — tal como acontecera antes da estreia de “Roda Gigante” —, o seu hotel predileto em Paris. Uma vez mais, foi um prazer ouvi-lo.
Como tem passado, sr. Woody Allen?
Acho que não estou nada mal, na medida que a idade me permite. Continuo a sentir-me ansioso e vulnerável, já era assim aos cinco anos, e aos 35, e aos 55... Agora já tenho 83. Começam a pesar-me um bocadinho. Se ao sair desta sala me der uma coisa má, ninguém ficaria surpreendido: pudera, com 83 anos! Mas continuo a trabalhar. Acabei agora mesmo de rodar um novo filme no País Basco, em San Sebastián, que é uma cidade encantadora — e a comida é deliciosa.
Como se chama esse filme?
Temos um título de trabalho, ainda não definitivo: “Rifkin’s Festival”. Talvez não dure até ao fim, estou tentado a mudá-lo. O filme passa-se, na verdade, durante o Festival de Cinema de San Sebastián mas não estou autorizado a contar muito mais [tanto quanto se sabe, trata-se de uma coprodução americano-espanhola com Christoph Waltz, Wallace Shawn e Gina Gershon no elenco e a fotografia, uma vez mais, é de Vittorio Storaro].
De qualquer forma, estamos aqui para falar sobre “Um Dia de Chuva em Nova Iorque” em que, entre outras coisas, descobrimos Liev Schreiber num papel secundário, a interpretar um realizador angustiado com o seu trabalho. Mas esse problema não parece afetá-lo na vida...
Humm, talvez se engane! Eu sempre tive problemas com o meu trabalho, do meu ponto de vista. A escrita do guião é um momento fantástico em que só dependo de mim próprio, o casting é uma aventura excitante em que tenho o apoio de pessoas com quem trabalho já há algum tempo [Patricia DiCerto colabora com o cineasta desde “Match Point”], mas quando a rodagem começa, quando ‘pomos a mão na massa’ e depois vemos o resultado, este é quase sempre desapontante. Na nossa cabeça, tudo funciona idealmente. Mas na vida real, quando ainda não se encontrou aquele décor perfeito, quando o dinheiro e os adereços faltam ou até os atores que queríamos, começamos a apercebemo-nos dos nossos próprios erros. E o cinema já não é tão bom assim.
Não está a ser demasiado severo consigo próprio?
A autocrítica e a contradição fazem parte do meu espírito. Sempre fui assim, não é agora em velho que vou mudar.
“Um Dia de Chuva...” é mais um filme seu com o nome de uma cidade no título — assunto recorrente desde que fez “Manhattan”, já lá vão 40 anos. Esta relação com um determinado espaço é crucial para si?
Eu sou um grande fã de cidades. Sempre quis que elas fossem personagens dos filmes, fosse Paris, Roma ou Nova Iorque, claro. Não me vejo a filmar em sítios de que não gosto. Quer dizer, a Nova Iorque de Scorsese ou de Spike Lee não tem nada que ver com a minha, que não é tão realista, mas sim uma Nova Iorque filtrada pela minha cabeça, de uma forma muito idealista. Não sei porquê, mas há qualquer coisa sobre áreas metropolitanas que significam sempre muito para mim, talvez porque elas são provas de civilização, porque têm teatros e livrarias. Quando cheguei aqui a Paris há dois dias a minha mulher meteu-se logo nos museus, mas eu não. Gosto de andar nas ruas. De descobrir coisas. De olhar para as pessoas.
Já lhe passou pela cabeça deixar os filmes para sempre, quem sabe para se dedicar por inteiro ao clarinete?
Se eu fosse um músico um bocadinho melhor do que na verdade sou, talvez pudesse fazer isso. Mas sou um amador. Com muito entusiasmo pelo que toco, mas um amador. Sou como um tenista de fim de semana que gosta de bater umas bolas. Jamais poderia ser um músico profissional, nem que vivesse um milhão de anos. Mas há outra coisa, sabe: filmar distrai-me. Impede-me de pensar que tenho 83 anos. Obriga-me a focar-me nos problemas triviais de cada projeto: as personagens, o guarda-roupa, a fotografia. Enquanto estiver focado nisso, estou bem. Com demasiado tempo livre ia tornar-me preguiçoso. Podia ler mais, ver mais desporto na televisão — e já vejo bastante — mas ia amolecer. E não quero. Então, enterro-me em trabalho o mais que posso.
Eu sou um grande fã de cidades. A Nova Iorque de Scorsese ou de Spike Lee não tem nada que ver com a minha, que não é tão realista, mas sim uma Nova Iorque muito idealista”
Fazer filmes significa hoje o mesmo para si que significava há três ou quatro décadas?
Ouça, eu faço filmes apenas e só porque há pessoas que os financiam! Não há nenhum segredo aqui. Se amanhã me dissessem que não há dinheiro, ficaria muito contente a escrever só para o teatro, ou livros, porque gosto de escrever. Agora, se há quem continua a pagar os filmes, sinto que não posso dizer ‘não’. A parte mais dura e difícil do cinema para um cineasta é arranjar dinheiro para um filme. Tudo o resto exige muito trabalho, mas não se compara àquele suplício.
É sobretudo na Europa que consegue esse financiamento?
Eu embolso-o de qualquer lado em que posso obtê-lo.
“Take the Money and Run”...
Ah! Esse foi há 50 anos. A Europa tem-me ajudado bastante. Eu tenho tido sorte porque, precisamente desde “Take the Money and Run”, os meus filmes foram sempre apreciados na Europa. Nunca consegui explicar esta atração, mas ela existe. E tenho beneficiado desta lealdade, de França a Espanha, da Itália à Alemanha... Eu podia arranjar mais dinheiro nos Estados Unidos mas eles exigem uma maior colaboração. Dizem-me que não querem ser tratados como banqueiros, querem saber quem serão os atores, ler o argumento, etc. Aqui na Europa, é diferente. Dizem-me: “Nós pagamos, avançamos com o dinheiro como um investimento, o senhor faça o filme que quiser.” Tenho mais liberdade, é óbvio.
Mudemos de assunto. Em “Um Dia de Chuva...” há um momento em que uma personagem desabafa que os jornais, agora, são todos tabloides. Ora, a imprensa atravessa, de facto, um momento difícil. Porque é que essa frase entrou no seu guião?
Porque acho que é a verdade. Houve um tempo em que havia tabloides e alguns jornais nos EUA que resistiam a essa tentação, mas a situação tornou-se tão desesperada para a imprensa — e falo da imprensa escrita — que até os melhores jornais tiveram que abraçar o sensacionalismo para sobreviverem. E eu acho que esse foi um passo em falso. Um tiro no pé. Quando eu era um jovem rapaz, havia uma dúzia de bons jornais em Nova Iorque. Comprava-os pela manhã, queria saber o que se passava na Broadway, por exemplo, e lá estava a crítica, boa ou má pouco importa, era a opinião do espetáculo que se estreara na noite anterior. Esse espaço foi-se reduzindo cada vez mais. E agora quase desapareceu porque a tal dúzia de jornais também já não existe.
Foi sempre um bom leitor do que se passa à sua volta?
Sempre tive no coração um feeling muito positivo, e romântico pelo jornalismo e por jornalistas. Quis em tempos ser um, aliás. Estava a pensar o que fazer com a minha vida e julguei que esse podia ser o caminho.
Como crítico?
Não, como repórter de crimes. Interessavam-me essas histórias. Ou ser jornalista desportivo. Acreditei sempre na ideia do repórter como um herói, alguém que chega e descobre a informação verdadeira e salva aquele desgraçado que foi falsamente condenado, etc. Esses dias são cada vez menos frequentes. E é uma vergonha que assim seja.

<span class="creditofoto">foto Jennifer S. Altman/Contour/Getty Images</span>
foto Jennifer S. Altman/Contour/Getty Images

Falou em romantismo pela imprensa. E você, sempre olhou para si próprio como um romântico? “Um Dia de Chuva...” é, de novo, uma comédia romântica.
Sempre me vi assim, é verdade! Mas é difícil sermos objetivos sobre nós. Vemo-nos de uma certa maneira e o mundo olha-nos de uma maneira muito diferente. E isto é que é chato! Mas esta diferença de pontos de vista, para quem quiser reparar bem, está muito presente em todos os meus filmes. E é por isso que não concordo assim tanto com quem diz que eu faço filmes narcisistas, enfim, cada qual que julgue o que quiser. No ecrã há o que nós somos, o que uma determinada personagem é, mas também o modo como o mundo a vê. E o mundo nunca a vê da mesma maneira. Enquanto eu crescia, sempre olhei para mim como um romântico.
Os seus espectadores também, quando o viam no ecrã...
Nem todos. E se não apareço mais nos meus filmes é simplesmente porque estou demasiado velho para interpretar o ‘protagonista romântico’. Então fico atrás da câmara: assunto resolvido. De qualquer forma acho que a maioria dos meus espectadores me viu sempre como o cómico de serviço. O fulano divertido. The comedian. Não como o romântico que eu acho que sempre fui. As comédias românticas, de resto, eram os filmes de que eu mais gostava na juventude.
Em que momento é que decidiu que Timothée Chalamet poderia ficar com o papel de Gatsby em “Um Dia de Chuva...” e entrar na sua já vasta galeria de personagens? A pergunta não vem ao acaso: eu acho que ele tem muito de si no filme.
Bom, o meu diretor de arte Santo Loquasto, com quem trabalho há décadas, fez uma peça de Tchekhov na Broadway e alertou-me para este rapaz: “Tens que conhecer o Timothée, ele é muito bom e acho que ele pode interpretar material novo — e muito bem.” Conheci-o, gostei dele, ele leu [o guião] muito bem e concordei. Nunca tinha visto nada dele antes. Mas é curioso o que diz: já me aconteceu mostrar um guião meu a um jovem ator com quem nunca trabalhei e notar que ele tende a parecer-se comigo. E é natural que isso aconteça, porque o guião é meu, escrevi cada frase, cada palavra, cada piada, e não tolero desvios e improvisos. Isto não é voluntário, acontece espontaneamente. Há sempre um feeling of me na personagem. É engraçado que gostei que isso não tenha acontecido quando fiz “Midnight in Paris” [2011] com o Owen Wilson, um ator um bocado mais velho. A personagem dele tinha a sua própria persona, muito forte, uma antítese do que eu sou, não havia qualquer rasto de mim, de todo.
Há uma cena em que Gatsby Welles, a personagem de Timothée, toca piano. Ele tocou-o realmente, em direto?
Sim, tocou. Foi ele.
Acho que a maioria dos meus espectadores me viu sempre como o cómico de serviço. O fulano divertido. The comedian. Não como o romântico que eu acho que sempre fui”
Voltemos ao dinheiro: alguma vez jogou póquer, ou qualquer outro jogo, para ganhar dinheiro extra para os seus filmes, tal como o Gatsby, que se autofinancia desse modo?
Eu costumava jogar póquer precisamente por essa razão!
Quando é que isso aconteceu?
Quando fui para Inglaterra trabalhar como ator no horroroso “Casino Royale” original [estreado em 1967], ou seja, antes de fazer o meu próprio cinema. É um filme catastrófico, a sério que é. Ninguém me conhecia. Não tinha ainda feito nada de importante. Nós passámos imenso tempo na rodagem e não havia nada que fazer. Então jogava póquer, obsessivamente. E com gente bem conhecida, atores célebres, eles estavam a fazer “The Dirty Dozen”, do Bob Aldrich, ali perto: o John Cassavetes estava lá, o Telly Savalas, o Charles Bronson, o Lee Marvin... Não havia noite em que não jogássemos.
Era bom jogador?
Era um muitíssimo bom jogador porque não tinha sentido de humor algum. É que todos eles jogavam por diversão e prazer. Queriam passar um bom bocado, bebiam que se fartavam, e eu estava ali a jogar como quem joga a vida. Ganhei muito dinheiro. Fiz uma soma muito razoável. Aliás, era raro haver noite em que não ganhasse. Deixei-os muitas vezes depenados, confesso.
Porque é que parou?
Ah, foi por culpa do célebre produtor de teatro americano David Merrick. Ele próprio tinha sido um grande jogador no passado e, num certo dia, fez-me ver que o jogo era uma perda de tempo. E nunca mais joguei.
Como é ter que viver na América de Donald Trump hoje em dia?
É de cortar à faca. Sabe, eu sou democrata, sempre fui. Votei em Hillary Clinton. Não sei se se recorda mas previ naquela altura que ela iria ganhar com bastante certeza, mas não ganhou, e eu enganei-me, como tantos outros. Estou calmamente à espera das próximas eleições para que um democrata volte a ganhar. Acho que a razão vai triunfar, que esta direita extremista vai recuar e que isso terá um efeito positivo no resto do mundo. Posso estar enganado. E se estiver, vai ser terrível. O extremismo político nunca fez nada de bom pela raça humana.
Você dirigiu Donald Trump em “Celebrity”...
Sim! Longe vai o tempo em que eu pensava nele como alguém que em tempos contratei como ator. E quer saber mais: ele era bom ator! Mesmo muito bom! Chegou ao set, foi muito cortês com toda a gente, fez o que lhe foi pedido, sabia as suas falas, essa foi a boa parte. Como Presidente, a situação é diferente... Tenho que dizer isto: a subida ao poder da direita e da Administração Trump tem dado azo na América a um enorme aumento da sátira e contribuído, também, para o aparecimento de novos comediantes, sobretudo na televisão. Eles reagem instantaneamente às declarações do Presidente. São muito criativos. Mas eu não sou um deles. Nunca fui um cineasta político.
Estou calmamente à espera das próximas eleições para que um democrata volte a ganhar. Acho que esta direita extremista vai recuar. Posso estar enganado. E se estiver, vai ser terrível”
Ainda hoje conseguiria ditar para um gravador as coisas pelas quais a vida merece ser vivida, como em “Manhattan”?
Tem graça, houve uma senhora que em tempos fez um reparo e me disse que eu não incluí os meus filhos nessa lista, apesar da minha personagem ser pai. Acontece que [na época de “Manhattan”] eu não era ainda pai na vida real. Nunca tal me ocorreu, mencionei apenas as coisas de que gostava. Não tinha qualquer experiência com crianças. Mas desde que as tenho, e desde que a minha vida gira em torno da minha mulher e dos meus filhos, eles seriam as prioridades de topo para mim, não aquele restaurante chinês, ou aquele filme, aquele disco...
Timothée Chalamet não é o único jovem ator de “Um Dia de Chuva em Nova Iorque”, temos também Elle Fanning ou Selena Gomez, que também chega ao seu cinema pela primeira vez. Timothée tem 23 anos, Selena 27, Elle apenas 21. São pessoas muito diferentes de si quando tinha a mesma idade?
Eu era muito menos sofisticado. As pessoas de 20 anos estão hoje extremamente cientes do que são, andam muito informados, sabem tudo sobre drogas, sexo, política, têm uma grande vantagem sobre mim. Eu era retraído, tímido, vivia refugiado no meu pequeno contexto burguês.
Mas eu não sei — e duvido muito — se as pessoas de 20 anos ouvem Bing Crosby ou Erroll Garner, e este filme está cheio de canções deles. A banda sonora foi uma maneira de se relacionar com a sua própria juventude?
Não sei. É provável. Talvez, intuitivamente. Eu faço sempre isso, ponho a música de que gosto, é uma das partes que me dá mais gozo nos filmes. No princípio, não há música, de todo. É depois, na montagem e na pós-produção, que vou à prateleira buscar os meus discos. Foi por isso que nunca contratei ninguém — ou só raras vezes o fiz — para compor uma banda sonora. Faço a minha juke box. E é essencialmente jazz music, clássica, ou música popular americana de uma certa era. Nada disto é novo para mim: cresci a gostar de música mais antiga, os meus amigos do liceu só queriam música pop, estavam-se nas tintas para Charlie Parker ou para Cole Porter.
Há uma bela mulher em “Um Dia de Chuva...” que logo se descobre ser uma prostituta: Terry. Não é a primeira nos seus filmes mas a aparição dela é inesperada. E é por causa dela que depois Gatsby tem aquele diálogo com a mãe que altera por completo a perceção que ele tinha da sua própria vida. Porque é que escreveu esse diálogo?
Senti que a história ia dar a esse diálogo e que o filme iria florir a partir daí. Achei divertido seguir as aventuras daqueles dois jovens universitários que julgam ir passar um bom bocado a Nova Iorque e depois se separam em várias aventuras, mas era preciso que a experiência florisse, que fosse dar a algum lado. E essa mudança começa, de facto, quando Gatsby encontra a prostituta no [bar] Carlisle. Ele estava a ter um mau dia. Não quer relacionar-se com a família. No fim, talvez aprenda duas ou três coisas essenciais. E essa mudança é necessária.
Este é também um filme sobre descoberta de identidades. Tem noção do momento em que descobriu a sua?
Eu lembro-me que, quando andava no liceu, todos os meus amigos tinham de fazer a grande decisão de escolher o que queriam estudar na universidade. Uns foram para medicina, outros para direito, outros para arquitetura, e a mim também me tocava decidir. Foi então que descobri que tinha algum sentido de humor e que fazia rir os outros. E que a minha identidade era essa. Isso funcionou para mim a nível profissional muito rapidamente. Ainda teenager, já estava a vender o que eu produzia. Soube então que, para o resto da vida, estaria ligado à comédia, e escrevi, escrevi muito, para a televisão, rádio, cabarets, até chegar aos filmes.
Alguma vez pensou em quem é a sua audiência?
Boa pergunta. Já, e nunca tirei grandes conclusões disso. Limito-me a fazer filmes, eles passam onde passam, se não os quiserem ver, não vejam, foi sempre assim. Eu não sei quem é a minha audiência. Mas sei que a tenho tido e que ela tem sido consistente um pouco por todo o mundo. Os meus filmes são exibidos na China, no Japão, em Marrocos, na Argentina e há sempre um pequeno público, nada que me faça ganhar uma fortuna, mas ele existe, em todo o lado... Até nos Estados Unidos, imagine!
Chateia-o que os filmes sejam cada vez menos vistos nas salas?
Isso é uma tristeza. A sério. Quando cresci, um dos grandes prazeres da vida era ir ao cinema ver cinema, com a namorada sexta-feira à noite, com a família aos fins de semana ou só como pretexto para faltar às aulas... O cinema era tudo. Até aquele fenómeno de fazer fila, de esperar pela vez, de comprar o bilhete, olhar para quem está à nossa volta e depois entrar numa grande e escura sala, em frente a um grande ecrã com gente carismática que nos ia contar uma história. É inigualável. Agora olho para as minhas filhas a verem filmes nos computadores. Se calhar, nem são filmes. E penso: caramba, que feliz que eu fui na minha infância quando ia ao cinema, com a minha lata de pipocas... Esta lenta erosão da experiência do cinema em sala é uma das coisas que mais me entristecem.
Por falar em coisas tristes: em meados deste ano, soube-se que nenhuma editora em Nova Iorque quis publicar a sua autobiografia por assuntos que estão ligados à sua vida privada. Um absurdo completo: o mais natural era esperar uma batalha de ofertas. Em que pé estão as coisas?
Mas vai ser publicada. Não quero falar muito disso mas, com sorte, será ainda este ano e mais cedo do que as pessoas pensam.
O que é que descobriu ao escrever sobre si próprio?
Olhe, descobri que não tive uma vida nada excitante por aí além. E ainda bem! Sou muito middle class. Levanto-me cedo todas as manhãs, faço um bocadinho de exercício antes do pequeno-almoço, começo a trabalhar, faço uma pequena pausa para praticar clarinete, depois vou dar uma volta com a minha mulher, vejo uns amigos. É é só. Nada de muito excitante. Não tenho casa de campo. Nem casa de praia. Nem barco, muito menos avião. Há uma série de anos, uma jornalista entrevistou-me e escreveu uma longa história sobre mim para a “Cosmopolitan”. O seu nome era Francine du Plessix Gray. Era muito conhecida nos Estados Unidos. E o artigo dela sublinhava: “Sobre Woody Allen, não há grandes histórias para contar.” E tinha razão.
Gosta de dias de chuva em Nova Iorque?
Eu acho que sabe a resposta a essa pergunta.
E em “Um Dia de Chuva em Nova Iorque”, quem é você?
Diria que o mais próximo de mim é o Gatsby. Com a mesma idade dele, também já tinha aquela enorme veia nostálgica dentro de mim.

sexta-feira, 18 de outubro de 2019



Na morte da grande bailarina e coreógrafa cubana

Alicia Alonso 
( 1920 -2019)
«Elle est la seule Latino-américaine de l’histoire à avoir été “prima ballerina assoluta”, un titre symbolique accordé aux ballerines les plus exceptionnelles de leur génération, la danseuse et chorégraphe cubaine est décédée jeudi matin, le 17 octobre, a indiqué à l’AFP un porte-parole du ballet de Cuba.

A Cuba, qu’elle n’avait jamais voulu abandonner malgré les propositions d’argent et de renommée à l’étranger, Alicia Alonso avait créé une école à part dans le monde du ballet : l’école cubaine, qui mélange rythmes et origines pour donner naissance à un style reconnaissable entre tous.»  (aqui)

Hoy 17 de octubre de 2019 nos ha dejado físicamente Alicia Alonso. Su legado es enorme, así como su arte. Alicia es de esas artistas que están en el corazón de la gente. El doctor Miguel Cabrera, historiador del Ballet Nacional de Cuba, nos deja estas emocionadas palabras.
Alicia en su eterna y universal cubaníaNuestra Alicia Alonso, quien durante 88 años
como bailarina, coreógrafa y pedagoga contribuyó
 con su arte genial a poner el prestigio de su Patria
en el más alto sitial en las cuatro esquinas del
 mundo, falleció en el Hospital CIMEIQ, de La
 Habana, a las 11 de la mañana de este
 jueves 17 de octubre del 2019, a  dos meses y
 tres días de cumplir  99 años de edad.

Nacida el 21 de diciembre de 1920, en el
reparto Redención, popular barriada de Marianao,
 en un modesto hogar formado por Antonio
Martínez Arredondo, teniente veterinario del
ejército, y Ernestina del Hoyo y Lugo, refinada
 modista, nuestra ilustre compatriota encontró
 en la danza desde muy temprana edad la
 vocación que guiaría toda su vida. Su
 ruta estelar, iniciada en la Escuela de
 Ballet de la sociedad Pro-Arte Musical de La
 Habana, en 1931, se vio obligada a
 tomar nuevos derroteros al tener que
 marchar al extranjero por el escaso nivel,
 los prejuicios y el carácter elitista que enfrentaba
 el ballet en la Cuba de entonces. Trazar su orbita
artística profesional es tarea ciclópea, pues
abarca desde las comedias musicales de
Broadway, el Ballet Caravan, el Ballet
Theatre de New York, el Ballet de Washington
y el Ballet Ruso de Montecarlo, hasta sus
 colosales triunfos como estrella invitada de
 las más relevantes compañías, festivales y
galas de ese género artístico en todo el
mundo. Su excepcional categoría  de
prima ballerina assoluta no obedeció a
 una caprichosa reputación jerárquica,
 sino al dominio de un vasto repertorio de
134 títulos que abarcó las grandes obras
de la tradición romántico-clásica y
creaciones de coreógrafos contemporáneos.
Cuando el 28 de noviembre 1995, en el Teatro
Massini de la ciudad italiana de Faenza, hizo
 un alto en su trayectoria como intérprete,
ya había logrado establecer un record difícil
 de igualar, no solo por el tiempo de
 vigencia sobre las puntas, sino por el nivel de
 excelencia con que lo hizo.

Pero la grandeza de la Alonso, para
 nosotros sus compatriotas, no radica
solamente en habernos representado triunfalmente
 en 65 países, recibir las más atronadoras
ovaciones, imposible de contabilizar, de Helsinki
 a Buenos Aires, de New York a Tokio o
Melbourne, sino haber puesto al servicio
 de su Patria todos los honores recibidos,
entre ellos los 266 premios y
 distinciones internacionales,225 de carácter
 nacional y las 69 creaciones coreográficas
 -románticas, clásicas y contemporáneas,
 que ha realizado,  revertiéndolos como
 frutos del quehacer que ella ha visto
siempre como modesta contribución no solo
 a su cultura, sino a la cultura danzaría mundial.

Hace más de medio siglo al regresar a
 nuestro país cargada de honores extranjeros,
 no vacilaba en declarar: “Toda mi esperanza
y mis sueños consisten en no volver a salir al
mundo en representación de otro país, sino
 llevando nuestro propia bandera y nuestro arte.
Mi afán es que no quede nadie que no grite:
 ¡Bravo por Cuba!, cuando yo bailo. De no ser
 así, de no poder cumplir ese sueño, la tristeza
 sería la recompensa de mis esfuerzos”.

Esa patriótica postura la llevó a fundar, junto a Fernando y a Alberto Alonso el 28 de octubre de 1948, el hoy Ballet Nacional de Cuba (BNC), y en 1950 la Academia de Ballet que llevó su nombre y tuvo la tarea histórica de formar la primera generación de bailarines dentro de los principios técnicos, estéticos y éticos de la hoy mundialmente reconocida escuela cubana de ballet. Durante 71 años, especialmente a partir del triunfo de la Revolución, pudo, con mano firme  situar al BNC entre las compañías de mayor prestigio a nivel mundial, fundamentar un sistema de enseñanza que hoy abarca la totalidad de la Isla y es la garantía del ballet cubano, así como estimular  un movimiento de colaboración internacionalista que en el campo del ballet Cuba ha extendido a casi medio centenar de países de América, Europa, Asia y África.. Es la Alicia guía y mentora, que con su don aglutinador pudo convocar en La Habana, en 26 Festivales Internacionales de Ballets, a las más célebres personalidades de la danza, en una fiesta de arte y amistad.. Y  es también la Alicia  que hemos visto dar la mejor entrega de su magisterio, lo mismo en escenarios de la más alta prosapia que en rústicas tarimas, en plazas públicas, fábricas, escuelas y unidades militares, consciente de que al pueblo, cualquiera que éste sea, siempre se asciende y nunca se desciende.

Los que tuvimos el privilegio de estar a su lado, conocimos también el extraordinario ser humano que había en ella, que por coraje y férrea disciplina no se dejó derrotar nunca por quebrantos físicos, vicisitudes o incomprensiones.

 Fue la Alicia nuestra, que aunque bañada de cosmopolitismo  añoró  oír  los cantos de nuestros gallos, gustar del olor al salitre de su Malecón habanero, valorar la mariposa y el coralillo como las flotes más exquisita, o fascinarse con los adelantos científicos y los misterios del cosmos. “Un ímpetu tenaz, frenético, heroico –disparado contra la enfermedad y contra el tiempo- hacia la perfección incansable.”, como acertadamente la definió Juan Marinello.

Via: o tempo das cerejas 2 http://bit.ly/2J1a2y9

quinta-feira, 17 de outubro de 2019



O Prémio Nobel

Dedicamos este artigo ao Publico que na altura fez uma cobertura vergonhosa , à vergonhosa  guerra  da Jugoslávia e que omite que mesmo o fantoche tribunal TPI de Haia absolveu Milosovic..

Handke Prix Nobel ; le travail de la transparence contre l’opacité de la langue médiatique

Rosa LLORENS
Coup de tonnerre dans le ciel serein des Nobel : après 20 ans de Purgatoire (depuis qu’en 1996 il a commencé à défendre la Serbie contre « la communauté internationale »), Peter Handke accède au Paradis du Nobel ! Les haines qu’il a déchaînées ne désarment pas pour autant, mais cette reconnaissance officielle permet de reparler de la guerre médiatique déchaînée, aussi criminellement que celle des bombes, contre la Yougoslavie, et de mesurer la grandeur de l’écrivain.
Journaux et revues, littéraires ou non, ne manquent pas de nous faire connaître les réactions indignées de Croates et Albanais : Actualitténous informe que le Premier ministre albanais, Edi Rama, a réagi sur Twitter : « Jamais je n’aurais pensé qu’un Prix Nobel puisse me faire vomir ». A-t-il vomi en apprenant que l’UCK, l’armée des Albanais du Kosovo, se livrait à un trafic massif d’organes prélevés sur des prisonniers serbes (Sur le Kosovo, voir, de Pierre Péan, Une guerre « juste » pour un Etat mafieux) ? Pourtant, en 2010, il fallait déjà avoir l’estomac bien accroché lorsqu’on a appris que le Nobel était attribué à Mario Vargas Llosa, ex-candidat libéral (c’est-à-dire adepte des criminels « Chicago boys ») à la présidence du Pérou.
Courrier International, courageusement, s’abrite, pour salir Handke, derrière The Guardian : « Le dramaturge autrichien, dont les origines slovènes lui avaient inspiré un nationalisme fervent pendant la guerre des Balkans, avait publiquement suggéré que les musulmans de Sarajevo s’étaient massacrés eux-mêmes » – assertions toutes biaisées, inexactes, voire grotesques : comment ses origines slovènes auraient-elles pu lui inspirer un nationalisme pro-serbe ? Sur les deux massacres de Sarajevo, voir l’article de Wikipédia : il en ressort que l’origine des tirs, bosniaque ou serbe, n’a jamais pu être déterminée avec certitude.
Elisabeth Philippe, dans L’Obs, qualifie de « propos très fermes » les injures de Jonathan Littell en 2008 : Hanke ? « un trou du cul ». Que voilà une brillante analyse littéraire ou historique !
Les médias ont répété, à l’occasion des guerres contre de la Yougoslavie, les offensives qu’ils allaient ensuite lancer contre l’Irak, la Libye, la Syrie, pour préparer les agressions militaires ; la différence, c’est que dans le cas de la Yougoslavie, ce n’est pas seulement un dirigeant qui a été diabolisé, « hitlérisé », mais tout un peuple, le peuple serbe, accusé d’expansionnisme, de nationalisme fanatique congénital, et, quand il essayait de se défendre en se référant à l’Histoire, de « paranoïa ».
Eh bien, tant pis, faisons de la paranoïa et citons un paragraphe de Wikipédia sur la Serbie pendant la 2ème Guerre Mondiale, où les Croates, pourvus par les nazis d’un gouvernement autonome, ont été dirigés par les Oustachis collaborationnistes : « Pratiquant volontiers les tueries à l’arme blanche et les égorgements, les Oustachis se distinguent par leur cruauté, mutilant leurs victimes dont ils arrachent le foie ou le cœur, ou tuant des enfants en bas âge dont ils obligent les parents à les enterrer avant de les exécuter eux aussi ; ils brûlent les cadavres des Serbes dans des fours crématoires – où des enfants sont parfois jetés vivants – ou les lancent dans des affluents du Danube pour qu’ils dérivent jusqu’à Belgrade, porteurs de « mots de compliment » pour les Serbes de la capitale. » La brutalité des Oustachis finit par être jugée contre-productive par leurs alliés nazis et fascistes : « Les Italiens vont jusqu’à s’opposer activement par endroits à leurs « alliés » croates, dont ils désarment certaines milices et contre lesquels ils protègent les populations civiles ».
Le chiffre des victimes serbes en territoire croate est estimé à 300 000 sur une population de 1,9 million.
Mais revenons à l’aspect littéraire de l’événement. Handke, comme Günter Grass (autre Prix Nobel), avait commencé une brillante carrière en suivant les modes littéraires du temps (notamment, pour le deuxième, le réalisme magique). C’est sur le tard que chacun d’eux a trouvé sa voie, et sa voix, propre, avec des formules littéraires originales (dans Toute une histoire, en 1995, pour le premier, dans Voyage hivernal vers le Danube, la Save, la Morava et la Drina, en 1996, pour le second), en même temps qu’ils inscrivaient leur œuvre dans l’actualité brûlante (le pillage de la RDA par l’Allemagne de l’Ouest pour l’un, les guerres, médiatiques autant que militaires, contre la Yougoslavie réduite à la Serbie pour l’autre). Et, bien sûr, c’est quand ils devenaient d’immenses écrivains qu’ils ont commencé à être contestés et même vilipendés.
Les deux écrivains ont encore une chose en commun : ils sont tous deux nés dans une région excentrique de leurs pays respectifs : Dantzig, aujourd’hui polonaise (Gdansk), pour Grass, la Carinthie, région-carrefour entre Italie, Autriche et Yougoslavie (aujourd’hui Slovénie), pour Handke. On peut voir là l’origine d’une intolérance particulière à la « vérité officielle », et de leur capacité à voir une même situation sous divers angles. C’est justement une nausée devant le caractère massif et unilatéral du lynchage médiatique de la Serbie qui a incité Handke, comme Régis Debray, à tenter de se faire sa propre opinion sur la situation, sans s’arrêter à la « vérité » diffusée à son de trompe depuis toutes les chaires médiatiques.
Debray est allé se rendre compte sur place au Kosovo, et en a tiré une Lettre d’un voyageur au Président de la République, ou Impressions de Yougoslavie : comme ce deuxième titre l’indique, il ne s’agissait pas d’opposer une vérité à une autre vérité, mais simplement d’attirer l’attention sur la masse de stéréotypes qu’on déversait au lieu de décrire le réel ; et il a été voué aux gémonies, parce que, au lieu de la Terreur que Milosevic était censé faire régner, il rapportait simplement avoir vu des gens paisiblement attablés aux terrasses des cafés.
Emir Kusturica aussi a été attaqué parce que, dans des formes exubérantes,il donne dans ses films une vision complexe des guerres yougoslaves, où chaque peuple massacre ses voisins devenus ennemis (après 50 ans de cohabitation pacifique dans chaque village, chaque ville, chaque immeuble, d’une porte à l’autre d’un même palier) au lieu de dénoncer un seul coupable et de ne voir dans les autres que des victimes.
Handke aussi a cherché, pour échapper aux stéréotypes, de nouvelles formes ; et on se rend compte que, pour se limiter à écrire « J’accuse » tel ou tel, Zola devait avoir derrière lui une bonne partie des médias, des partis et de l’opinion publique.
Pour Handke, qui devait affronter ce qu’on appelle « la communauté internationale » (c’est-à-dire les médias des principales puissances occidentales), la tâche était beaucoup plus difficile. Il refuse de « dénoncer »(même si parfois, l’indignation contre certains journaux, comme Le Nouvel Observateur, ou Libération, ou contre certains hommes politiques comme Javier Solana, alors président de l’ONU, l’emporte), de dire le droit, et même simplement d’affirmer. Il invente une nouvelle forme littéraire, l’essai-reportage, où il procède par balayages successifs, où il tourne autour de son sujet (d’où le titre de Autour du Grand Tribunal), où il pose des questions, en accumulant les petites notations précises, les « choses vues ».
Ainsi, il ne dénonce pas l’illégitimité du TPI (le Tribunal Pénal International, qui n’est que le bras judiciaire des vainqueurs pour achever les vaincus) ; il raconte comment il découvre, sur place, la prison où est enfermé Milosevic : « La prison royale de Scheveningen se trouve sur le chemin de la station de pompage. Celui-ci conduit ensuite dans les dunes […]. Même de très près, même quand on était en face de la prison, celle-ci donnait l’impression d’être dissimulée. Le mur d’enceinte était construit en petites briques, presque délicates, semblables à celles de la rangée d’habitations située devant lui et qui, maison après maison, le soustrayait au regard. Le soustrayait au regard ? Bien sûr, ce n’était pas du tout le cas. Car comme il est d’usage en Hollande, il n’y avait pas de rideaux dans ces maisons, et quand on regardait par la fenêtre de devant, on pouvait en même temps apercevoir le salon tout entier et jeter un regard à l’extérieur par celle de derrière », l’extérieur, c’est-à-dire la prison. Handke fait ainsi une satire presque naïve de la fausse transparence calviniste, qui cache l’essentiel en affichant l’accessoire, en même temps qu’il annonce le thème principal de Autour du Grand Tribunal : la « télé-vérité », cette vérité que nous sommes persuadés de posséder, alors que nous n’en avons que des reflets à travers des écrans, sans en avoir aucune expérience directe.
De même, au cours du procès de Milosevic, il remarque que le regard est invinciblement attiré par le dispositif omniprésent d’écrans qui le met en scène, et qui se reflétera à son tour dans l’écran de télévision de chaque foyer. De même aussi, il ne dénonce pas le manque de crédibilité des témoins bosniaques ou croates de massacres serbes (sauf à citer un cas précis de faux témoignage dans le procès du Serbe Novislav Djacic, condamné par un tribunal munichois pour des faits s’étant passés très loin de là, sur une simple assertion) : il observe plutôt, sur place, dans son hôtel, un témoin kosovar, dont il décrit ainsi le retour auprès d’un groupe de compatriotes, après sa prestation au Tribunal : « Des saluts fusent à son arrivée ; de toute part, les bras prennent leur élan avant la poignée de main ; suivent des rires soulagés et des discussions animées, pendant des heures – comme après un examen réussi ? Regard très lumineux du témoin. Jamais encore je n’avais vu quelqu’un découvrir ses dents de la sorte, pas même Fernandel. »
Ou bien il oppose le « style » des photos, pathétiques, montrant des réfugiés « victimes » et celles, beaucoup plus rares, de réfugiés serbes : « Pourquoi ces Serbes-là n’étaient-ils pour ainsi dire jamais montrés en gros plan et presque jamais seuls, mais presque uniquement par petits groupes et presque exclusivement à mi-distance ou en arrière-plan, disparaissant justement et presque jamais non plus, à la différence de ceux Croates ou Musulmans qui souffrent avec, eux, le regard en plein et douloureux sur la caméra, mais bien plutôt de côté ou vers le sol, comme conscients d’être coupables ? Comme une tribu étrangère ? – ou comme trop fiers pour poser ? Ou trop tristes pour cela ? »
Le sous-titre du Voyage hivernal était, dans l’édition en allemand, « Justice pour la Serbie » (Handke l’a supprimé dans l’édition française parce que « rendre justice en écrivant, c’est trop évident ; ça se comprend de soi-même) ; il pourrait être aussi bien « Justice pour le réel  ; ou « Justice pour l’écriture » : chez Handke, qui lutte contre la langue de bois médiatique, « chaque paragraphe parle et traite d’un problème de la représentation, de la forme, de la grammaire, de la véracité esthétique et cela comme depuis toujours, dans mes livres », lit-on dans la Préface au Voyage hivernal. Il ne s’agit pas seulement des Serbes, mais de la possibilité pour chacun d’avoir accès au réel, sinon (c’est impossible) en chair et en os, du moins à travers une langue travaillée pour réduire au minimum son inévitable opacité. Pour cela, le Prix Nobel décerné à Peter Handke est indiscutablement mérité.
Rosa LLorens
Via: FOICEBOOK http://bit.ly/2MPCfJg
 “Em Creta, com o Minotauro”
I
Nascido em Portugal, de pais portugueses,
e pai de brasileiros no Brasil,
serei talvez norte-americano quando lá estiver.
Coleccionarei nacionalidades como camisas se despem,
se usam e se deitam fora, com todo o respeito
necessário à roupa que se veste e que prestou serviço.
Eu sou eu mesmo a minha pátria. A pátria
de que escrevo é a língua em que por acaso de gerações
nasci. E a do que faço e de que vivo é esta
raiva que tenho de pouca humanidade neste mundo
quando não acredito em outro, e só outro quereria que
este mesmo fosse. Mas, se um dia me esquecer de tudo,
espero envelhecer
tomando café em Creta
com o Minotauro,
sob o olhar de deuses sem vergonha.
II
O Minotauro compreender-me-á.
Tem cornos, como os sábios e os inimigos da vida.
É metade boi e metade homem, como todos os homens.
Violava e devorava virgens, como todas as bestas.
Filho de Pasifaë, foi irmão de um verso de Racine,
que Valéry, o cretino, achava um dos mais belos da “langue”.
Irmão também de Ariadne, embrulharam-no num novelo de que se lixou.
Teseu, o herói, e, como todos os gregos heróicos, um filho da puta,
riu-lhe no focinho respeitável.
O Minotauro compreender-me-á, tomará café comigo, enquanto
o sol serenamente desce sobre o mar, e as sombras,
cheias de ninfas e de efebos desempregados,
se cerrarão dulcíssimas nas chávenas,
como o açúcar que mexeremos com o dedo sujo
de investigar as origens da vida.
III
É aí que eu quero reencontrar-me de ter deixado
a vida pelo mundo em pedaços repartida, como dizia
aquele pobre diabo que o Minotauro não leu, porque,
como toda a gente, não sabe português.
Também eu não sei grego, segundo as mais seguras informações.
Conversaremos em volapuque, já
que nenhum de nós o sabe. O Minotauro
não falava grego, não era grego, viveu antes da Grécia,
de toda esta merda douta que nos cobre há séculos,
cagada pelos nossos escravos, ou por nós quando somos
os escravos de outros. Ao café,
diremos um ao outro as nossas mágoas.
IV
Com pátrias nos compram e nos vendem, à falta
de pátrias que se vendam suficientemente caras para haver vergonha
de não pertencer a elas. Nem eu, nem o Minotauro,
teremos nenhuma pátria. Apenas o café,
aromático e bem forte, não da Arábia ou do Brasil,
da Fedecam, ou de Angola, ou parte alguma. Mas café
contudo e que eu, com filial ternura,
verei escorrer-lhe do queixo de boi
até aos joelhos de homem que não sabe
de quem herdou, se do pai, se da mãe,
os cornos retorcidos que lhe ornam a
nobre fronte anterior a Atenas, e, quem sabe,
à Palestina, e outros lugares turísticos,
imensamente patrióticos.
V
Em Creta, com o Minotauro,
sem versos e sem vida,
sem pátrias e sem espírito,
sem nada, nem ninguém,
que não o dedo sujo,
hei-de tomar em paz o meu café.
Poesia-III (Peregrinatio ad Loca Infecta, Exorcismos, Camões Dirige-se aos Seus Contemporâneos, Conheço o Sal… e Outros Poemas, Sobre Esta Praia…), Moraes Editores, 1978
Via: voar fora da asa http://bit.ly/2BjuJ4k

domingo, 13 de outubro de 2019


A Ditadura Fascista e os caminhos da Arte em Portugal

Quando a extrema-direita e os saudosistas do salazarismo (incluindo, assuma-o ou não, o presidente PS da CM de Santa Comba Dão) ressurgem com crescente agressividade, recordar o que foi o regime fascista em Portugal é de novo obrigatório. Entre as mais corajosas e combativas frentes da resistência conta-se a dos intelectuais antifascistas, que nunca permitiu espaço de manobra e de credibilidade às tentativas de captação do regime. Esse combate dos intelectuais permanece inteiramente actual.
Falar dos caminhos da Arte em Portugal durante o longo e negro período dos 48 anos da ditadura fascista, derrubada pelos capitães de Abril em 1974, exige que, em primeiro lugar, se entendam as características desse regime opressor.
Muito sinteticamente: um golpe militar, em 28 de Maio de 1926, apoiado pelas forças mais reaccionárias, instaurou um Governo de Ditadura Militar, que rapidamente evoluiu para uma Ditadura Fascista, com a dissolução do Parlamento, a proibição de todos os partidos políticos, a criação de uma Censura sobre os jornais, livros e todos os meios de comunicação, a instauração de uma polícia política feroz contra todos os adversários do regime e a depuração do aparelho militar, com expulsão e prisões de militares fieis ao regime republicano. São estes os pilares do novo regime.
Oliveira Salazar tornou-se chefe do Governo em 1932, só depois de lhe estarem garantidas as condições para liquidar todos os que se lhe poderiam opor. Salazar estava ligado e tinha o apoio dos regimes fascistas de Mussolini, instaurado em Itália desde 1922, e de Hitler, que acabara de ser nomeado Chanceler em 1932. Eles foram os modelos seguidos por Salazar, no plano político e também de propaganda.
Foi seguindo esses exemplos que Salazar criou, em 1933, o Secretariado de Propaganda Nacional (SPN), para o qual nomeou António Ferro, um intelectual que tinha passado em 1927 pela direcção da Revista Orpheu dos modernistas portugueses e que depois publicou grandes elogios àcerca dos regimes de Mussolini e de Hitler, no livro ”Viagens à volta de duas ditaduras”, e escreveu uma biografia glorificando Salazar, editada em Itália, o que lhe garantiu a nomeação e a confiança deste, para dirigir a chamada “política do espírito”: designação do ditador à sua política de captação dos intelectuais, subordinada aos objectivos do regime.
O momento culminante deste trabalho de propaganda política surgiu em 1940, com a inauguração da Exposição do Mundo Português, ligada a um conjunto de Obras Públicas sob orientação do engenheiro Duarte Pacheco, e, no plano artístico e propagandístico, sob a direcção de António Ferro.
Salazar proclamou a grandiosidade do regime, afirmando que ”esse ano de 1940 seria perpetuado no dobrar dos tempos e na imaginação dos vindouros”.
A imponência simbólica da Exposição de Belém contou com a captação de numerosos arquitectos e artistas plásticos, particularmente os adeptos do regime, como Pardal Monteiro, autor das gares marítimas de Lisboa, Veloso Reis, do Museu de Arte Popular, que permanece ainda, o arquitecto Cottinelli Telmo e o escultor Leopoldo de Almeida, responsáveis, entre outras obras, pelo Padrão dos Descobrimentos, que se mantém junto ao rio.
Na Exposição, foi glorificado o Império Colonial português, com aldeias africanas reconstruídas e habitadas pelos povos das colónias, exibidos ali como animais num Jardim Zoológico.
Durante a Exposição, foram encenados grandiosos e sumptuosos desfiles históricos, da autoria de Leitão de Barros.
Muitos escultores executaram obras para a Exposição, como Francisco Franco, Barata Feio e também Canto da Maia, António Duarte e outros.
Mas os artistas que António Ferro mais elogiava e pretendia que fossem um exemplo a seguir pelos escultores portugueses, como um receituário, eram Leopoldo de Almeida e Barata Feio, que marcavam os limites do academismo.
Pintores como Almada Negreiros e sua mulher Sara Afonso, Bernardo Marques e Eduardo Viana, embora tenham participado na Exposição de Belém e expusessem nos salões do SPN, mantinham maior independência.
É necessário esclarecer que a “Exposição do Mundo Português” ocorreu em 1940, quando Hitler e Mussolini, aliados entre si e amigos de Salazar, estavam no seu apogeu, tendo ajudado militarmente a vitória de Franco contra a República Espanhola e iniciado, em 1939, a II Guerra Mundial, em que, na altura, obtinham grandes vitórias.
A derrota do nazi-fascismo, particularmente graças aos êxitos militares do Exército Soviético, culminando com a vitória das forças aliadas em Maio de 1945, determinou a viragem na correlação de forças mundial e fez tremer Salazar, cujos aliados tinham sido vencidos.
As enormes manifestações com que, em Portugal, celebrámos esta vitória, deram um enorme impulso às forças da Oposição e permitiram a criação do MUNAF e o MUD Juvenil, sob o impulso do Partido Comunista Português.
Nessa onda de unidade das forças antifascistas, os intelectuais progressistas tiveram um importante papel. Um papel que vinham tendo há muito, embora discretamente. É necessário não esquecer que a génese do movimento antifascista a nível cultural, inspirado pela teoria marxista do materialismo histórico, vinha desde os meados dos anos trinta a ser divulgada por jornais como “O Diabo”, de que um dos directores foi o advogado Campos Lima (bem conhecido em Portimão), “O Sol Nascente” e a revista “Vértice”.
Foram as importantes polémicas literárias desenvolvidas por esses periódicos que originaram o nascimento do neo-realismo na literatura, em defesa de uma “arte útil”, virada para os problemas reais da sociedade.
Foi uma nova geração de escritores que então surgiu, exigindo uma maior intervenção cívica e cultural dos escritores e artistas, contrária aos ideais do regime fascista.
Destacaram-se, nesta frente, Alves Redol (Gaibéus-1939); Manuel da Fonseca (Rosa dos Ventos-1940); Soeiro Pereira Gomes (Esteiros-1941) e Carlos de Oliveira (Uma abelha na chuva-1953).
A estes escritores, juntaram-se outros, como José Cardoso Pires, Ilse Losa, Urbano Tavares Rodrigues, Augusto Abelaira e Sttau Monteiro, que se centraram também numa mais ampla preocupação, não só quanto ao conteúdo, mas também quanto à forma.
Aliás, foi a batalha pelo conteúdo (sem desprezar a forma), que caracterizou este período, em que surgiu com força o movimento neo-realista português.
Logo a seguir à vitória contra o nazi-fascismo, com o temporário recuo de Salazar e o crescendo das forças da Oposição, e na sequência do já desenvolvido movimento literário do neo-realismo, os artistas plásticos progressistas ganharam força para contestar as imposições políticas de António Ferro, que lhes fechava as portas das únicas grandes salas de exposições, que eram as do SPN (que depois da guerra mudou de nome para Secretariado Nacional de Informação, SNI) e os Salões da Sociedade Nacional de Belas Artes, em que era imposto um estreito academismo.
Tratou-se então de conquistar, por meio de um amplo trabalho unitário, uma direcção aberta à modernidade para a SNBA, que dispunha de amplos salões de exposição, até então fechados a artistas que não fossem adeptos do regime, e académicos quanto ao estilo.
Foi graças a um amplo movimento iniciado pelos alunos da ESBAL e por outros artistas não adeptos ao regime, que se conseguiu eleger uma direcção mais aberta e democrática para a SNBA, presidida pelo escultor Anjos Teixeira.
Foi a partir desta vitória, que, em 1946, tiveram inicio, na SNBA, as Exposições Gerais de Artes Plásticas (EGAP), que, durante dez anos, até 1956, constituíram não só um verdadeiro acto de confrontação cultural com o regime fascista, mas também um real incentivo para a criatividade livre e descomprometida, particularmente dos jovens artistas, que até ali não tinham tido hipóteses de expor as suas obras.
Os dez anos de existência das EGAP não se passaram sem ataques da repressão. Uma das exposições foi encerrada pela PIDE depois da abertura e vários quadros retirados.
Mas os artistas resistiram e as EGAP constituíram uma abertura e um campo adequado para a apresentação de manifestações artísticas que lutavam pela conquista da expressão livre, pelo que, a cada artista, interessava exprimir como fundo e forma e, em última análise, contribuindo para fomentar uma renovação do panorama artístico português.
Foi assim que, nas EGAP surgiram, com a força e pujança da juventude, novas camadas de artistas, que não tinham acolhimento nos Salões do SNI de António Ferro. Esses jovens artistas rebeldes iriam afirmar-se no futuro como artistas marcantes na Arte Portuguesa. Entre eles Júlio Pomar, cujo mural no cinema Batalha do Porto foi mandado tapar pela PIDE, por representar cenas populares das festas do S. João no Porto (restam fotos), Lima de Freitas, Querubim Lapa (natural de Portimão), os escultores Maria Barreira, Vasco da Conceição, e ainda José Dias Coelho, e Jorge Vieira, com o seu projecto de monumento ao prisioneiro político desconhecido (já executado em Beja).
Muitos outros artistas, de renome, iniciaram-se nessas exposições, como os pintores Rolando Sá Nogueira, João Hogan, Rogério Ribeiro, Maria Keil, e os arquitectos Sena da Silva, Castro Rodrigues, Hernani Gandra e P.Cid.
Ficou claro que, se o neo-realismo adquiriu maior visibilidade a partir da EGAP, e nelas predominou, a verdade é que estas apresentavam uma pluralidade de opções estéticas decorrente dos objectivos de abrangência e de unidade política dos seus organizadores. Nelas participaram, enquanto o quiseram, surrealistas e artistas abstractos.
A própria evolução daqueles que, tendo sido cultores da prática e da reflexão plástica do neo-realismo, passaram para outras opções estéticas, comprovam que ali tinham ganho o poderoso impulso do inconformismo e da luta pelo novo, que os catapultou para novas experiências, como Júlio Pomar, Lima de Freitas, Querubim Lapa e Rogério Ribeiro.
Um aspecto pouco conhecido é que as Exposições Gerais de Artes Plásticas acolheram nos seus salões, pela primeira vez, a fotografia como expressão artística, pois, até ali, só era exposta nos foto-clubes e exposições fotográficas de amadores. Nelas participaram, com fotografias, Victor Palla (depois publicadas no livro “Lisboa, cidade triste e alegre”), o arquitecto Keil do Amaral e Augusto Cabrita, o grande fotógrafo de temática neo-realista.
Também pela primeira vez, as EGAP apresentaram a gravura, nas suas várias modalidades, dentro do critério de que a gravura é uma das formas de arte que mais facilita a divulgação ampla entre as camadas populares.
Na Escola Superior de Belas Artes, não se ensinava então a gravura, e foi a partir do incremento dado pelas EGAP que artistas que nelas expunham criaram a Cooperativa de Gravura, em 1956, que deu enorme incremento a esta forma de arte.
Com a criação da Fundação Gulbenkian, em 1956, sem dúvida que maiores facilidades se abriram aos artistas portugueses.
Mas a verdade é que a frente dos intelectuais antifascistas nunca permitiu espaço de manobra e de credibilidade às tentativas de captação do regime fascista.
E na revolução do 25 de Abril, participaram com a sua arte nos momentos exaltantes da vitória do MFA. Como fizeram Cipriano Dourado, com as suas gravuras, e o grande artista João Abel Manta, com os seus cartazes.

Nota: Esta é a palestra proferida por Margarida Tengarrinha, membro do Partido Comunista Português, Resistente Anti Fascista, ex deputada à Assembleia da República após o 25 de Abril e Artista Plástica, na segunda-feira, dia 22 de Abril, na tertúlia sobre “A Arte antes e depois do 25 de Abril de 74”, que teve lugar no Café-Concerto do Teatro Municipal de Portimão.
A autora escreve segundo o anterior Acordo Ortográfico.
Fonte: https://www.sulinformacao.pt/2019/04/a-ditadura-fascista-e-os-caminhos-da-arte-em-portugal/?fbclid=IwAR31sSVvWV5bs20opFldEhX8oAeHlJ-TPyKf_xxucguo4ua0_r-Q7zkVxW8

sábado, 14 de setembro de 2019

Santiago, Itália: Nanni Moretti não quis ser imparcial

Moretti mostra desde a alegria dos tempos de vitória de Allende, aos momentos de pavor, tortura e morte que se seguiram ao golpe militar.

Não sou imparcial“, diz Nanni Moretti a um militar encarcerado por homicídio e rapto nos tempos da ditadura de Augusto Pinochet neste Santiago, Itália, documentário que apesar de fugir ao cinema militante clássico invade os ecrãs com uma mensagem e montagem bastante claras quanto à posição do cineasta e a natureza do golpe de estado perpetrado no Chile a 11 de setembro de 1973.
Construído num misto de entrevistas com imagens de arquivo e muita documentação centrada no papel da embaixada de Itália em Santiago nessa Era (uma verdadeira “arca de noé” para os dissidentes políticos do regime de Salvador Allende), Santiago, Italia faz uma homenagem, não apenas às vítimas imediatas do golpe, os chilenos, mas igualmente aos dois jovens diplomatas italianos que abriram as portas da embaixada para refugiar todos os que tentavam escapar a esse novo regime ditatorial. Para Moretti, esses dois diplomatas – Piero de Masi e Roberto Toscano – foram um “exemplo de como os indivíduos podem fazer a diferença” na sociedade, especialmente tratando-se de duas pessoas da sua geração, da sua juventude.
Esta mesmo Itália, que agora expulsa e deixa os refugiados à deriva no Mediterrâneo (encontra-se subentendido no timing de lançamento deste documentário uma crítica ao regime atual), agiu na época com um grande sentido de humanismo, até porque se sentia no país, especialmente nos movimentos de esquerda, que aquele golpe era o fim de um sonho: pela primeira vez um governo de esquerda chegava ao governo através de eleições livres e não pelas armas, mas de nada valeu, pois Pinochet atropelou esse sonho.
São muitas as vozes que o italiano reúne em 80 minutos documentais que recorrem muitas vezes a imagens de arquivo. De jornalistas aos diplomatas, passando por muitas outras áreas, onde não faltam realizadores; Moretti recolhe depoimentos que vão desde a alegria dos tempos de vitória de Allende, aos momentos de pavor, tortura e morte que se seguiram ao golpe militar. Em comum em quase todas as vozes de quem conta as histórias percebe-se o sofrimento daqueles dias e o medo que se havia instalado. O cineasta Miguel Littín é um desses testemunhos, não tendo dúvidas que Allende foi assassinado, ao contrário de outros, que colocam a hipótese de ter cometido suicídio.

Littín é, aliás, um dos cineastas chilenos mais ativos a contar esse período negro da história do seu país, tendo viajado clandestinamente durante a ditadura e filmado centenas de horas de material documental (experiência relatada em livro por Gabriel Garcia Marquez), para além de, mais recentemente, ter assinado obras como Dawson – Isla 10, que aborda o encarceramento numa ilha remota dos mais próximos do regime de Salvador Allende, ou Allende en su Laberinto, sobre o golpe e a transformação do Palácio de La Moneda no último reduto da democracia chilena.
Mas como se entendeu no primeiro parágrafo, Moretti dá também tempo de antena aos golpistas, bem definidos por si como os vilões: dois militares do regime Pinochet com posições, visões e experiências diferentes sobre as razões do golpe militar. Não são testemunhos suficientes – nem o tempo dedicado – para poder entender com maior profundidade as suas intenções reais e um fio condutor do pensamento que explique as suas ações, mas como Moretti disse, ele não está aqui para imparcialidades. Mas quem está?
Crítica de Jorge Pereira
(Nota: este texto foi originalmente publicado no c7nema, um dos mais antigos sites de informação, opinião e crítica de cinema em Portugal, tendo sido aqui reproduzido com a devida autorização.)
Com a devida vénia

quinta-feira, 12 de setembro de 2019

Arte povera

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
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Pino Pascali, Trappola (1968)
Arte povera (pronuncia-se arte póvera; em português "arte pobre") foi uma expressão criada pelo crítico e curador italiano Germano Celant,[1] para referir-se ao movimento artístico que se desenvolveu originalmente na segunda metade da década de 1960 na Itália. Os seus adeptos utilizavam materiais de pintura (ou outras expressões plásticas não convencionais, como por exemplo areia, madeira, sacos, jornais, cordas, feltro, terra e trapos) com o intuito de "empobrecer" a obra de arte, reduzindo os seus artifícios e eliminando barreiras entre a Arte e o quotidiano das sociedades.[2]
O movimento artístico desenvolveu-se ao longo da década de 1970, período em que os artistas voltaram a sua atenção para as temáticas da natureza e seus derivados, rompendo com os processos industriais e revelando a sua critica ao empobrecimento de uma sociedade guiada pelo acúmulo de riquezas materiais.[3]

Artistas ligados ao movimento

Referências


  • Dempsey, Amy. Estilos, escolas e movimentos: Guia enciclopédico da arte moderna. Tradução: Carlos Eugênio Marcondes de Moura. São Paulo: Cosac & Naify, 2003. 166-168 p.

  • Renata da Silva Moura (2002). «Uma experiência da Arte Povera». PUC-Rio. Consultado em 7 de janeiro de 2015. Arquivado do original em 11 de janeiro de 2015

    1. Infopédia, Arte povera, acessado em 7 de janeiro de 2015.

    Ver também

    Bibliografia

    Ligações externas



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