domingo, 5 de junho de 2011

Alberto Pimenta

A Encomenda do Silêncio



Já reparaste que tens o mundo inteiro

dentro da tua cabeça

e esse mundo em brutal compressão dentro da tua cabeça

é o teu mundo

e já reparaste que eu tenho o mundo inteiro

dentro da minha cabeça

e esse mundo em brutal compressão dentro da minha cabeça

é o meu mundo

o qual neste momento não te está a entrar pelos olhos

mas através dos nomes

pois o que tu tens dentro da tua cabeça

e o que eu tenho dentro da minha cabeça

são os nomes do mundo em brutal compressão

como um filtro ou coador

de forma que nem és tu que conheces o mundo

nem sou eu que conheço o mundo

mas os nomes que tu conheces é que conhecem o mundo

e os nomes que eu conheço é que conhecem o mundo

o qual entra em ti e o qual entra em mim

através dos nomes que já tem

de forma que o que entra pelos meus olhos não pode

entrar pelos teus olhos

mas só pela tua cabeça através

dos nomes dados pela minha cabeça

àquilo que entrou pelos meus olhos já com nomes

e do mesmo modo

o que entra pelos teus olhos não pode

entrar pelos meus olhos

mas só pela minha cabeça através

dos nomes dados pela tua cabeça

àquilo que entrou pelos teus olhos já com nomes

e assim o que tu vês

já está normalmente dentro de ti antes de tu o veres

e assim o que eu vejo

já está normalmente dentro de mim antes de eu o ver

e tudo quanto tu possas ver para aquém ou para além dos nomes

é indizível e fica dentro de ti

e tudo quanto eu possa ver para aquém ou para além dos nomes

é indizível e fica dentro de mim

e é assim que vamos construindo a nós mesmos pela segunda vez

tu a ti e eu a mim...

construindo urna consciência irrepetível e intransmissível

cada vez mais intensa e em si

tu em ti eu em mim

no entanto continuando a falar um com o outro

tu comigo e eu contigo

cada um

tentando dizer ao outro

como é o mundo inteiro que tem dentro da cabeça

e porque é e para que é

tu o teu mundo que tens dentro da tua cabeça

eu o meu mundo que tenho dentro da minha cabeça

até que morra um de nós

e depois o outro...

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