quarta-feira, 30 de junho de 2010

Canções tradicionais portuguesas

PARTINDO-SE
 (João Roiz de Castelo Branco)

Senhora, partem tão tristes
Meus olhos por vós, meu bem!
Que nunca tão tristes vistes
Outros nenhuns por ninguém!
Partem tão tristes, os tristes,
Tão tristes e tão saudosos!
Tão saudosos...
Tão doentes da partida,
Tão cansados e tão chorosos!
Da morte mais desejosos,
Cem mil vezes que da vida!
Partem tão tristes, os tristes,
Tão fora de esperar bem!
De esperar bem...
Que nunca tão tristes vistes
Outros nenhuns por ninguém!

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Miguel Hernandez



As Mãos

Duas espécies de mãos se confrontam na vida,

brotam do coração, irrompem pelos braços,
caiem, e desembocam sobre a luz ferida
a golpes e punhadas.


A mão é a ferramenta da alma, a sua mensagem,
e o corpo tem nela o seu ramo combatente.
Levantai e movei as mãos num grande marulhar,
homens da minha semente.


Ante a aurora vejo surgir as mãos puras
dos trabalhadores terrestres e marinhos,
como uma primavera de ridentes afagos
de dedos matutinos.


Teimosamente povoadas de suores,
as veias retumbam desde as unhas partidas,
cobrem os espaços de andaimes e clamores,
relâmpagos e gotas.


Manejam utensílios, enxadas e teares,
mordem metais, montes, raptam machados, carvalhos,
e constroem, querendo, até mesmo no mar
fabricas, povoados, minas.


Estas sonoras mãos escuras e luzidias
revestem-se de uma pele curtida, invencível
e são inesgotáveis e generosas fontes
de vida e de riqueza.


Como se com os astros a poeira pelejasse,
como se os planetas lutassem com gusanos,
a espécie das mãos trabalhadora e clara
luta com outras mãos.


Ferozes e juntas num bando sangrento
avançam quando se afundam os céus vespertinos
umas mãos de osso lívido e avarento,
paisagem de assassinos.


Não tocaram nem cantam. Os seus dedos soltam roncos,
mudamente esvoaçam, multiplicam-se, propagam-se.
Não teceram o burel, nem nasceram os troncos,
e lânguidas de ócio vagueiam.


Empunham crucifixos e acumulam tesouros
que a ninguém pertencem se não a quem os labora,
e seus mudos crepúsculos absorvem os sonoros
caudais da aurora.


Orgulho de punhais, arma de bombardeios
com um cálice, um crime e um morto em cada garra:
executoras pálidas de negros desejos
que a avareza impõe.


Quem lavará estas mãos lodosas que se lançam
à água e a desonram, envergonham e estragam?
Ninguém lavará mãos que no punhal se incendeiam
e no amor se apagam.


As laboriosas mãos dos trabalhadores
cairão sobre as vossas com dentes e cutelos.
E aos pés de muitos exploradores
elas cairão cortadas.


Miguel Hernández
(tal como Lorca assassinado pelos franquistas)


~~~~~~
" Recordar a Miguel Hernández que desapareció en la oscuridad y recordarlo a plena luz, es un deber de España, un deber de amor. Pocos poetas tan generosos y luminosos como el muchachón de Orihuela cuya estatua se levantará algún día entre los azahares de su dormida tierra. No tenía Miguel la luz cenital del Sur como los poetas rectilíneos de Andalucía sino una luz de tierra, de mañana pedregosa, luz espesa de panal despertando. Con esta materia dura como el oro, viva como la sangre, trazó su poesía duradera. ¡Y éste fue el hombre que aquel momento de España desterró a la sombra! ¡Nos toca ahora y siempre sacarlo de su cárcel mortal, iluminarlo con su valentía y su martirio, enseñarlo como ejemplo de corazón purísimo! ¡Darle la luz! ¡Dársela a golpes de recuerdo, a paletadas de claridad que lo revelen, arcángel de una gloria terrestre que cayó en la noche armado con la espada de la luz! "


Miguel Hernández, visto por Pablo Neruda

sábado, 12 de junho de 2010

Canções tradicionais portuguesas (Baixo Minho)

MOLEIRINHA

Ó que lindos olhos
Tem a moleirinha
Tão mal empregados
Andar à farinha

Andar à farinha
Andar ao calor
E ó que lindos olhos
Tem o meu amor

Tem o meu amor
Tem a a ramalhada
E ó que lindos olhos
Tem a minha amada

sábado, 5 de junho de 2010

Canções tradicionais portuguesas

ANDORINHA DA PRIMAVERA

Andorinha de asa negra
Aonde vais,
Qua andas a voar tão alto
Leva-me ao céu contigo, vá
Que eu lá de cima
Digo adeus ao meu amor

Ó andorinha da Primavera
Ai quem me dera também voar
Que bom que era, ó andorinha,
Na Primavera poder voar

Andorinha de asa negra
Aonde vais,
Que andas a voar tão alto
Leva-me ao céu contigo, vá
Que eu lá de cima
Digo adeus ao meu amor

Ó andorinha da Primavera
Ai quem me dera também voar
Que bom que era, ó andorinha,
Na Primavera poder voar

quinta-feira, 3 de junho de 2010

A História

Ao analisar factos históricos, evita ser profundo, pois muitas vezes as causas são bastante superficiais.
R.W. Emerson (filósofo e poeta norte-americano, 1803-1882)

A história é uma galeria de quadros onde há poucos originais e muitas cópias.
Ch.-A. de Tocqueville (historiador francês, 1805-1859)

Mário Botas




“Seldom we find” says Solomon Don Dance
“Half an idea in the profoundest sonnet”
E.A.Poe


A fisionomia, o carinho das coisas impalpáveis,
o balbuciar, todo em amarelo, dos limões...
Cintura na pedra,
correio subtil de Lesbos para Marte.


Antinous visitou-me. Deixou a casa desarrumada
e um projecto em mim demasiadamente longo.
No frágil da memória eu durmo e sou eu
deuses de papelão sentando-se a meu lado.


No leito fluvial por onde dorme o cisne
chamam por mim os outros príncipes. Todos
irmãos.


Escuridão nova na velha escuridão,
efeito de luz nas janelas do poema...
O meu cão dorme. He is a poet, isn’t he?

Mário Botas